Crítica | Um Filme Minecraft: um universo de blocos, clichês e carisma reciclado

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A adaptação cinematográfica de Minecraft tenta transformar a criatividade infinita do jogo em uma aventura de 100 minutos, mas tropeça.

Gabriel Barbosa

Publicado em 7 de Abril de 2025, às 07h26

Um Filme MinecraftUm Filme Minecraft. Foto: Divulgação

Adaptar Minecraft para o cinema era uma ideia que dividia opiniões desde o princípio. Como transformar um jogo sem enredo fixo, baseado em liberdade criativa total, em uma narrativa com começo, meio e fim?

A resposta de Hollywood foi simples: não transformar. Um Filme Minecraft aposta em uma fórmula conhecida — e esgotada — para preencher o vazio da ausência de história com referências, piadas infantis e um enredo que parece ter sido montado por um algoritmo mais preocupado em agradar investidores do que crianças.

A expectativa, claro, era alta. Não apenas porque Minecraft é um dos jogos mais populares da história, mas também por reunir nomes como Jason Momoa, Jack Black e o diretor Jared Hess (Napoleon Dynamite, Nacho Libre). O resultado, porém, é tão genérico quanto uma vila de NPCs repetindo frases prontas em um mapa aleatório.

Jason Momoa e Jack Black no filme Um Filme Minecraft. Foto: Divulgação

Uma narrativa que mastiga e não engole

A principal falha da produção está na sua falta de identidade. O roteiro — escrito a várias mãos — parece incapaz de assumir uma direção clara: ora tenta ser uma comédia autorreferente, no estilo de A Aventura Lego ou Barbie, ora recorre à mesmice de aventuras juvenis com artefatos mágicos e lições superficiais sobre amadurecimento.

Logo nos primeiros minutos, Um Filme Minecraft despeja sobre o espectador um infodump expositivo na voz de Jack Black. O que poderia ser uma introdução divertida torna-se um incômodo monólogo que subestima a inteligência até do público infantil.

E esse didatismo se estende por toda a projeção, com personagens explicando tudo o tempo todo, em vez de permitir que a história flua organicamente. É o oposto do mantra do bom cinema: “mostrar, não contar”.

Jason Momoa fora da zona de conforto (e isso é bom)

Jason Momoa como Garrett Garrison no filme Um Filme Minecraft. Foto: Divulgação

Apesar de limitado por um roteiro apático, Jason Momoa surpreende. Ele interpreta Garrett Garrison, um ex-herói decadente do mundo de Minecraft, e entrega uma performance leve, autodepreciativa e bem distante do estereótipo do brutamontes carismático que o consagrou em Aquaman.

Sua química com Jack Black é o verdadeiro combustível do filme. A parceria, que nasceu fora das telas em entrevistas recheadas de bromance e piadas internas, transparece em cena. Black, como sempre, é uma força da natureza — ainda que aqui, em muitos momentos, seu personagem soe mais como um NPC hiperativo do que como um guia envolvente.

Uma estética bonita, mas sem vida

Visualmente, Um Filme Minecraft acerta em parte. O CGI é competente, e há momentos em que a transição entre live-action e animação convence. Porém, o universo retratado carece de personalidade. Para uma franquia que gira em torno da imaginação, é decepcionante ver ambientes tão genéricos e situações tão previsíveis.

Passamos por aldeias que parecem recicladas de outros filmes, minas com diamantes que remetem a aventuras dos anos 80, e uma “dimensão do mal” que poderia estar em qualquer outra produção infantojuvenil. A tão prometida “loucura” de Jared Hess aparece apenas em lampejos — como uma luta entre um zumbi montado em um frango e o personagem de Momoa —, mas nunca o suficiente para marcar o longa como algo único.

A fórmula desgastada dos blockbusters de IP

Há também um problema mais profundo: Um Filme Minecraft não é um filme que quer ser feito. Ele parece um filme que precisa ser feito. Como parte de um plano corporativo para explorar uma IP valiosa, a obra abraça a nostalgia e o fan service sem a menor preocupação em construir algo novo. É a síndrome do “filme feito por comitê”, uma colagem de ideias testadas que agradam a todo mundo e, ao mesmo tempo, não encantam ninguém.

Em tempos onde adaptações de games podem atingir patamares artísticos e emocionais — vide The Last of Us ou Arcane —, Um Filme Minecraft parece um passo atrás.

Ainda há salvação?

Curiosamente, sim. Há um charme inegável na dupla principal, e algumas piadas arrancam risadas genuínas, principalmente nas cenas mais absurdas. A direção de arte, embora limitada, mostra cuidado na recriação de itens icônicos do jogo. E o filme até se permite, em raros momentos, brincar com metalinguagem.

É possível que o público infantil se divirta, e talvez esse seja o verdadeiro objetivo da produção. No entanto, justificar um filme fraco apenas por ser “para crianças” é desonesto. Filmes infantis também podem — e devem — ter criatividade, alma e inteligência. Divertida Mente está aí para provar isso há anos.

Um Filme Minecraft é o exemplo perfeito de como a indústria pode desperdiçar um conceito rico ao tentar diluí-lo em fórmulas prontas. Salvo por um elenco carismático e alguns momentos engraçados, a obra é, no fim, uma aventura esquecível — e isso, num universo que deveria exaltar a criação, é um paradoxo lamentável.