O verdadeiro significado do vilão vampiro de Pecadores, filme de Ryan Coogler
Em Sinners, Ryan Coogler transforma um vampiro irlandês em um símbolo poderoso e surpreendente. Qual o significado? Descubra
Publicado em 29 de Abril de 2025, às 21h52
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O principal vilão do sucesso de bilheteria dirigido por Ryan Coogler,Pecadores, não é apenas um vampiro irlandês estiloso — ele representa séculos de tensão histórica, cultural e racial.
O filme, ambientado no Sul dos Estados Unidos durante os anos 1930, mergulha na interseção entre a música negra, a opressão racial e uma abordagem única ao mito dos vampiros.
Um vilão que dança e aterroriza
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Jack O’Connell interpreta Remmick, o mestre vampiro que lidera uma horda de mortos-vivos. Quando não está se alimentando de sangue, ele e seus seguidores tocam músicas folclóricas irlandesas e dançam com uma intensidade hipnótica.
O contraste entre essas apresentações e o blues executado no clube dos gêmeos Smoke e Stack (vividos por Michael B. Jordan) revela o cuidado de Coogler em tratar ambas as tradições musicais com reverência.
Ao invés de retratar o vampiro branco como uma metáfora direta da supremacia branca, Coogler dá a Remmick uma complexidade inesperada. O diretor revelou sua paixão por música folk irlandesa e afirma que a cultura afro-americana se conecta mais com a irlandesa do que muitos imaginam. Essa mistura dá profundidade simbólica à ameaça sobrenatural.
A presença sombria da KKK — e o verdadeiro papel de Remmick
Embora o filme mencione a Ku Klux Klan e a mostre no clímax, Remmick não se alinha explicitamente a esse grupo. Ao contrário, ele já transformou em vampiros um casal branco com ligações à Klan e demonstra fascínio pela música tocada dentro do clube negro.
Sua proposta aos protagonistas — se juntar à sua comunidade de vampiros — não é sobre destruição, mas sobre integração, ainda que forçada. No entanto, o convite é, no fundo, um pacto com o mal, carregado de implicações morais e culturais.
Um monstro com raízes históricas
“Era importante para mim que ele fosse velho, mas também que viesse de uma época anterior às definições raciais que temos hoje”, disse Coogler ao IndieWire. Antes mesmo do tráfico transatlântico de escravos, a Inglaterra colonizou a Irlanda no século XII e reprimiu duramente seus habitantes por manterem sua cultura.
No século XIX, nos Estados Unidos, a sociedade colocou os imigrantes irlandeses católicos no mesmo patamar social que os afro-americanos. Um escravizado chegou a dizer: “Meu mestre é um tirano. Ele me trata como um irlandês comum.”
Ainda assim, o sistema americano tratou de separar essas populações com conflitos e ressentimentos. A rebelião dos irlandeses contra o alistamento forçado durante a Guerra Civil e a não convocação de homens negros livres é um exemplo. Em Pecadores, essa tensão é refletida em Remmick: mesmo carismático, ele continua sendo uma ameaça — e uma representação da assimilação forçada disfarçada de solidariedade.
A dança da tradição contra o blues da resistência
Em uma cena marcante, Remmick dança do lado de fora do clube ao som de “The Rocky Road to Dublin” — uma canção que, no passado, seria proibida pelas Leis Penais britânicas. O ato é um gesto de orgulho cultural, mas também de dominação. O clube, inicialmente um espaço de celebração do blues e da cultura negra, passa a correr o risco de ser dominado pelos acordes sedutores dos vampiros.
Remmick tenta transformar Smoke, sua ex-esposa Annie (Wunmi Mosaku), o primo Sammie (Miles Caton) e outros em vampiros. Seu poder não está apenas na força física ou na imortalidade, mas na ideia de que resistir a ele é inútil. Ele representa uma ameaça simbólica: a de uma cultura dominante que, mesmo marginalizada historicamente, pode se tornar predatória quando tenta consumir outra.
Um novo significado para velhos símbolos
Os vampiros de Pecadores mantêm os elementos clássicos do gênero — presas, aversão à luz solar, sedução mortal —, mas Coogler injeta novas camadas ao mito. A presença irlandesa dá ao vilão uma história, um trauma e uma força que vai além do mal puro. Através de Remmick, o diretor não apenas ressignifica o terror, mas também provoca reflexões sobre identidade, pertencimento e as cicatrizes do passado.
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