Crítica: Vitória, com Fernanda Montenegro, retrata resiliência da velhice

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Vitória emociona ao retratar a solidão e a resiliência na velhice, com Fernanda Montenegro brilhando em uma atuação poderosa.

Autor Gabriel Barbosa
Gabriel Barbosa

Publicado em 26 de Março de 2025, às 23h46

Fernanda Montenegro no filme VitóriaFernanda Montenegro no filme Vitória. Foto: Divulgação

A luta silenciosa de uma mulher idosa contra a violência urbana forma o cerne de Vitória, longa estrelado por Fernanda Montenegro. Inspirado em uma história real, o filme não se limita à exposição dos fatos, mas mergulha na sensibilidade de uma protagonista que resiste ao esquecimento e à indiferença.

Andrucha Waddington assume a direção do projeto, originalmente pensado por Breno Silveira, e entrega um drama contido, mas profundamente tocante.

Desde o início, é evidente que a história de Dona Nina (Montenegro) é sobre muito mais do que uma simples luta por justiça. A câmera acompanha sua rotina com paciência, revelando a solidão através de pequenos gestos e silências.

Dona Nina (Montenegro) e Bibiana (Linn da Quebrada) no filme Vitória.
Dona Nina (Montenegro) e Bibiana (Linn da Quebrada) no filme Vitória. Foto: Reprodução

Aliás, ela está sempre em busca de companhia, tentando preencher o vazio de um cotidiano marcado pelo isolamento. É essa ausência de conexões que torna tão calorosos os momentos em que encontra conforto, como na amizade com Bibiana (Linn da Quebrada) ou no carinho trocado com Marcinho (Thawan Lucas).

Direção de Vitória

A direção se destaca ao retratar a resistência de Nina sem recorrer às armadilhas do melodrama. Montenegro carrega a narrativa com uma atuação magnética, expressando com olhares e gestos contidos o peso de sua jornada.

Um dos momentos mais marcantes acontece no terceiro ato, quando a personagem recebe uma notícia que muda sua perspectiva. Sem derramar uma lágrima, a atriz transmite uma avalanche de emoções, provando, mais uma vez, por que é um dos maiores nomes do cinema brasileiro.

O uso da filmadora como ferramenta de denúncia também adiciona uma camada simbólica ao enredo. Para Nina, registrar a movimentação dos criminosos não é um ato heroico, mas sim uma tentativa de reafirmar sua presença em um espaço que se tornou hostil. Quando a violência atravessa sua casa, o ato de filmar se transforma em sua última forma de resistência.

Roteiro do filme Vitória

Se há um ponto que pode ser questionado, é a estrutura do roteiro, que em certos momentos recorre a exposições excessivas. O realismo cru de Vitória poderia ser ainda mais potente sem algumas cenas que reiteram informações já claras pelo subtexto. No entanto, esse detalhe não compromete a força da narrativa, especialmente devido ao elenco afinado e à direção cuidadosa.

O desfecho, em especial, ressoa de maneira poderosa. Ao ser forçada a abandonar seu lar, Nina é transformada em Vitória, uma identidade imposta pelo Programa de Proteção a Testemunhas. O plano final, que a mostra se afastando da praia enquanto observa pela janela do carro, sintetiza sua “derrota” silenciosa. Perder sua casa é perder parte de si mesma, e a despedida é tão amarga quanto inevitável.

Mais do que um filme sobre crime e justiça, Vitória é um retrato sensível da velhice, da resiliência e da luta para existir em um mundo que muitas vezes ignora os que vieram antes.

Fernanda Montenegro entrega uma atuação memorável, elevando a obra para além do relato factual e transformando-a em uma experiência cinematográfica inesquecível.