Crítica de Mickey 17: Uma aventura espacial absurda, engraçada e ácida de Bong Joon Ho
Mickey 17 nos leva a uma aventura espacial, carregada com a crítica típica de Bong Joon Ho e humor. Confira a crítica
Publicado em 30 de Março de 2025, às 20h32
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Bong Joon Ho está de volta e quem acompanha sua carreira sabe que ele não tem medo de fazer crítica social direta, e até abrasiva.
Mickey 17 é a mais recente prova disso. A trama carrega uma abordagem que mistura sci-fi com humor ácido e uma crítica à sociedade. Além disso, ao capitalismo e às relações de classe, tudo com a marca registrada do cineasta.
O enredo de Mickey 17
A trama gira em torno de Mickey (Robert Pattinson), um “dispensável”. Quer dizer que ele é uma pessoa cuja única função é ser usada como cobaia em missões espaciais perigosas. Então, sabendo que, caso morra, uma versão clonada de si mesmo, com as memórias do “original”, o substituirá.
O 17 no título indica que Mickey é o 17º clone da sua série, cada um morrendo em uma missão mais absurda que a anterior. E é justamente esse conceito de descarte humano que Bong Joon Ho usa para criar uma crítica mordaz ao sistema capitalista.
Atuação de Robert Pattinson
Pattinson, mais uma vez, surpreende em um papel que poderia facilmente cair em clichês. Sua interpretação de Mickey é uma mistura de inocência, desespero e humor, algo que o ator consegue entregar com maestria.
Ele brilha ao viver a diferença entre as versões do personagem, especialmente entre o Mickey 17, mais inseguro e calado, e o Mickey 18, mais assertivo e audacioso.
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Em um filme que explora a morte de tantas formas, a performance do ator não só garante momentos de comédia, mas também cria uma das dinâmicas mais intrigantes da história.
A crítica social de Mickey 17
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A crítica social em Mickey 17 é inconfundível. O personagem de Mark Ruffalo, Kenneth Marshall, é uma caricatura de um político egocêntrico, com ecos claros de figuras como Donald Trump. Ele apresenta a figura do empresário messiânico que se preocupa apenas com o lucro, enquanto manipula os outros em prol de seus próprios interesses.
Aliás, Bong Joon Ho não deixa passar batido nem mesmo nas piadas mais grotescas, como a ideia de “raça pura” do bilionário, que reflete a perpetuação de discursos e práticas que ainda dominam o mundo real.
Em termos de estilo, o diretor parece ter jogado a sutileza para o lado e apostado em uma abordagem mais escrachada, com momentos de humor absurdo e cenas viscerais, mas sem perder de vista a crítica de classe.
Se em Parasita as críticas eram mais sutis e envolviam a crítica à divisão de classes através de uma narrativa complexa, aqui, ele não economiza na exposição do desprezo da elite, em uma ficção científica que já é divertida e envolvente por si só, mas que, ao mesmo tempo, oferece uma reflexão afiada sobre a natureza do sistema econômico que rege o nosso mundo.
O visual de Mickey 17 é impressionante. A nave espacial, os planetas e as criaturas alienígenas são apresentados com uma riqueza de detalhes que mergulham o público em um futuro não muito distante, mas com uma clara crítica ao modelo de colonização interplanetária que reflete a exploração da Terra, especialmente em tempos de crises ambientais.
A direção de arte impressiona, mas são as cenas de ação que realmente se destacam: há uma sensação de urgência e perigo que faz com que o espectador se envolva completamente.
O roteiro de Mickey 17
No entanto, não podemos ignorar os problemas do filme. O roteiro, com 2 horas e 19 minutos, exagera na explicação das motivações e sentimentos dos personagens. Em vários momentos, há diálogos excessivamente expositivos, o que enfraquece a fluidez da narrativa e, por vezes, quebra o ritmo da história.
O humor ácido e cínico de Bong Joon Ho também pode não agradar a todos – as piadas, que em muitos momentos são involuntariamente engraçadas, nem sempre conseguem cumprir o papel de arrancar boas risadas.
Por outro lado, as atuações de um elenco excepcional, como Steven Yeun, Mark Ruffalo e Toni Collette, ajudam a criar uma atmosfera divertida, apesar de todo o tom sombrio da trama. A química entre os atores torna o filme mais leve, mesmo em seus momentos mais pesados.
Naomi Ackie, por sua vez, é uma das grandes surpresas do filme, oferecendo uma atuação sincera e carismática como uma das poucas pessoas que realmente se importa com Mickey.
Em resumo, Mickey 17 é uma aventura de ficção científica visualmente impressionante e tecnicamente bem executada. Apesar disso, se distancia da elegância sutil de filmes anteriores de Bong Joon Ho, como Parasita e Memórias de um Assassino.
O filme é mais direto, mais escrachado, mais ácido. Embora isso possa desagradar alguns, não deixa de ser uma obra que vale a pena ser vista. Seja pela crítica social afiada, pelas atuações impressionantes e pela capacidade do diretor de brincar com gêneros de uma forma única.
Por fim, talvez não seja o que os fãs de Bong Joon Ho esperavam. Mas ainda assim, Mickey 17 é um filme intrigante e divertido. A trama é carregada com uma profunda reflexão sobre o capitalismo e a natureza humana disfarçada de uma aventura espacial.